“Eu não sou eu nem sou o outro, Sou qualquer coisa de intermédio(...)”

09 abril 2010

o sonho do sonhar


Ilustração - YUKO SHIMIZU


I
Fecho os olhos e adormeço. Adormeço e sonho. Sonho e quase que enlouqueço!

Que raio de sonhos são estes, que eu sonho? O sonho é algo assustadoramente estranho!
Estranho a estranheza de estranhar os sonhos.

Sei bem o que sou e o que quero.
Não é nenhuma contradição este meu estado de sonho.
Não me permito sequer sentir essa inquietude que o sonho me provoca.
Sonho, acordo e desligo.

II
Sonho? Que sonho? Já me esqueci do que sonhei. Sei apenas que envolvia pessoas minhas e não minhas, que misturava alguns dos ingredientes da minha vida, que não tinha pés nem cabeça, que era agradável mas bastante irreal. Sei também que não o contarei nunca a ninguém, sou egoísta demais para ter sequer alguém a quem o possa contar.

III
Gosto de pensar que em sonhos sou todas as personagens que ao mesmo tempo gostaria de ser, não exactamente ao mesmo tempo no sentido do tempo exacto, mas aquela que quero ser hoje, aquela que me irá apetecer ser amanhã, ou ainda aquela outra que irá despertar em mim depois de amanhã e por aí fora... acho que se compreende, não é assim tão complicado. Nós somos uma pessoa, temos compromissos para com a vida dos quais só nos desligamos quando estamos a sonhar. É tudo inconsciente, é esse o segredo. Somos muitos num só. Como se esse estado de inconsciência fosse a desconstrução de um puzzle que teimamos em ir completando de dia para dia à medida que passam os dias que fazem parte daquilo a que chamamos a nossa vida.

Por mais peças que apareçam para encaixar, tudo se resume depois à desconstrução. As peças todas encostadas umas às outras mas sem encaixarem, a baterem com as pontas umas nas outras num frenesim a ver quem consegue primeiro alcançar o seu objectivo que é desconstruir o caminho da peça ao lado. No fim de contas todas lutam no mesmo sentido, pensam essencialmente nas que estão ao lado e não em si próprias, a pensar que estão a defender o seu eu quando afinal estão a fazer o contrário. Que raio de desconstrução que vai para aqui!

IV
O que é engraçado é que tudo não passa de um ensaio. Um ensaio para tentar perceber porque tenho sonhos repetidos de tempos em tempos, porque sonho tanto com coisas nas quais raramente penso. Por exemplo, aquela casa com que sonho cheia de divisões, de onde vem essa casa? É sempre a mesma e é o cenário de diferentes histórias. Estou agora a lembra-me do sonho com os elevadores, eu sinceramente acho que tenho mesmo muito medo de andar de elevador e depois invento que vou antes pelas escadas porque quero fazer exercício... Estava eu a dizer, o sonho do elevador, sonho com um prédio com trezentos e tal andares e como tenho medo do elevador começo a subir as escadas, começo a baralhar os andares, já não sei onde é a minha casa que afinal é apenas um quarto mas com cozinha e tudo, e que às vezes passa a ser um hotel, depois desisto e tento apanhar o elevador para conseguir marcar o andar para onde quero ir, mal entro no elevador este começa a subir, a subir, a subir e nunca mais pára parece que se desintegra... essa parte já não sei bem como é pois o sonho acaba quando já estou muito aflita. Quando tenho este sonho que aparece de vez em quando, depois de o ter, quando acordo, penso sempre no filme “e viveram felizes para sempre” que também tem um elevador a subir pelos céus num sonho de uma mulher e no sonho dela aparece o johnny depp, a mim é que nunca me apareceu tal coisinha, pelo menos que eu me lembre... dito assim parece brejeiro e até injusto... mas é engraçado lembrar-me agora deste filme, tem tudo a ver com o que às vezes sinto.


4 de Fevereiro de 2009