“Eu não sou eu nem sou o outro, Sou qualquer coisa de intermédio(...)”

28 agosto 2006

o amor



[Tom & Jerry]

Ele | Nós | Eu


Ele
Ele para mim: “Quero adivinhar o teu nome, qual é a primeira letra?” Com o tom de brincadeira que quase sempre o acompanha, lá foi dizendo vários nomes. Este, aquele e mais aquele outro... não conseguiu adivinhar!

Lembro-me de comentar o quanto me causou estranheza aquela forma descontraída com que se dirigiu a nós. Agia como se nos conhecesse desde sempre. Justificada por ser um miúdo. Assim parecia. Eu que desconfio de tudo e de todos até acabei por achar natural. E era. Suscitou-me interesse o seu modo arrojada de enfrentar o desconhecido. A princípio, incomodava-me toda aquela energia. Não parava de falar, nem quando estava sozinho! Nesses momentos, a música que produzia falava por ele.

A sua forma de dançar era inebriante, pegava em nós e transformava o que eram dois corpos num só. Foi talvez nessa altura que comecei a olhar para ele com outros olhos. Não dei muita importância ao assunto. Pareceu-me que não reparava em mim, olhava para mim como o fazia para com as outras pessoas. Mas sempre com os seus olhitos doces e atrevidos. Lembro-me apenas daquela vez em que dançámos e ele, no fim da dança, colocou as suas delicadas mãos sobre os meus ombros. Foi por breves instantes, mas foi assim que aconteceu. Um afecto.

Nós
Voltámo-nos a ver passado dois dias. Ele quis um abracito. Mais um afecto. Eu correspondi, mas fui um pouco impessoal. Aquele era um dia em que não estava particularmente feliz. Nos dias seguintes fui-me sentindo mais liberta e com vontade de avançar para o desconhecido. Muito ao de leve, com toda a suavidade e sem pressas, pode-se dizer que fizemos a corte um ao outro. Assim como quem não quer a coisa. Aconteceu darmos uns beijos. Beijos estonteantes.

Eu
Ele levou-me por inteiro para o seu mundo. Foi uma sensação tão boa! Uma completa descontracção. Deixei-me levar e correspondi a todas as carícias, a todas as brincadeiras. Voltei para casa a sorrir de alegria. Leve como uma criança. Não o voltei a ver. Espero por esse momento.

28 de Agosto de 2006

A noite em que a lua me levou




A lua uma noite veio até mim e levou-me. Encavalitei-me nela e fui até onde as estrelas vivem. Lá bem no alto. Estava em quarto decrescente, a lua. Encaixei na perfeição as minhas pernas na sua curva côncava. O meu sexo roçava nela de uma forma agradável, desencadeando um leve prazer. Demos a volta à terra naquela noite. O sabor da liberdade. Inebriada de prazer, deixei-me levar para onde ela quis. Sentia-me inteiramente descontraída, de tão suave que eram os seus carinhos. Carinhos de lua.

No fim da noite, deitou-me na minha cama e despediu-se com um beijinho delicado. Beijinho de lua. Prometeu voltar. E eu sei que ela volta. A lua volta sempre.

28 de Agosto de 2006

A leitura


Invadida por uma profunda tristeza, mal conseguira dormir. Trabalhar? Nem pensar! Organizou apenas uns papéis. O porquê de se sentir assim, para agora não interessa. Com sono, mas sem forças para dormir, pegou no livro e prosseguiu com a leitura que tinha deixado a meio há uns dias atrás. A vontade era pouca. Não acreditava que a leitura a fizesse esquecer nem por instantes a tristeza que sentia. Surpresa agradável: o contrário aconteceu! Viu-se possuída por o desejo de se tocar, de sentir prazer, de se libertar. Os músculos do seu ventre contraíam-se a pedir atenção. Continuou com a leitura até se sentir exausta. Enrolou-se nos lençóis, a boca quase sem respirar de encontro a almofada e colocou a mão no ventre fazendo pequenos movimentos com os dedos. Já estava tensa outra vez, mas não queria desistir da sensação que tivera há minutos atrás. Insistiu com o movimento dos dedos, tornando-os agora um pouco mais agressivos. O calor começou a aparecer. Movimentava os dedos e parava um pouco a sentir o calor quase insuportável que lhe faziam os lençóis sobre o corpo nu. Tentou conter o orgasmo, o que conseguiu apenas por um ou dois minutos. A ansiedade era tanta que explodiu de prazer já sem precisar de fazer qualquer movimento com os dedos. Quis mais um orgasmo depois e assim o obteve. Durante o prazer, em que pensou? Não sabe bem, desta vez não sabe dizer. Talvez nela.

madrugada de 27 de Agosto de 2006


Maluquice talvez, mas apetece-me escrever. Apetece-me brincar com as palavras mais difíceis de dizer.

27 agosto 2006


Eu não sou eu nem sou o outro,
Sou qualquer coisa de intermédio:
--Pilar da ponte de tédio
--Que vai de mim para o Outro.

Mário de Sá-Carneiro (Lisboa, Fevereiro de 1914)